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Prefeitura Municipal de Alexânia

Veto ao Autógrafo n.º 1295/2014 de 06 de May de 2014

Veto ao Autógrafo de Lei Complementar nº 1295 - 2014 - Desconto no pagamento de ITU e IPTU


Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 10, doart.38, da Lei Orgânica Municipal, decidi vetar na integra o Autógrafo de Lei Complementar n° 1.295, de 08 de maio de 2014, que "Concede desconto no pagamento de ITU e IPTU nas formas que especifica, e dá outras providências".

RAZÕES DO VETO

Inicialmente, tem-se a dizer que Lei em tela, ao conceder o sobredito desconto no pagamento de ITU/IPTU ao contribuinte que não for atendido em sua demanda relativa ao tapamento do buraco ou reparação do asfalto está, de forma nitidamente transversa ou obliqua, vinculando a receita de imposto. E como é de comezinha sabença, 0 ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO NÃO ADMITE A VINCULAÇÃO DE RECEITA DE IMPOSTO A QUALQUER ATIVIDADE ESTATAL ESPECÍFICA, RELATIVA AO CONTRIBUINTE. Trata-se do principio da não-afetação de receita de impostos insculpido na Constituição Federal de 1988 e reproduzido pela Constituição do Estado de Goiás.

0 artigo 167, inciso IV, da Constituição Federal de 1988 é elucidativo ao preceituar ser vedada:

"(...)

IV — a vinculacão de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os artigos 158 e 159, a destinação de recursos para a manutenção e desenvolvimento do ensino, como determinado pelo artigo 212, e a prestação de garantias As operações de crédito por antecipação de receita, previstas no artigo 165, § 8°, bem assim o disposto no § 4° deste artigo." (g.n.)

Afinado pelo mesmo diapasão, a Constituição do Estado de Goias,em seuart.112, preceitua: 

"Art. 112 - São vedados:

(...)

IV - a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação com os Municípios, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelosarts.198, § 2°, 212 e 37, XXII da Constituição da República, e a prestação de garantias As operações de crédito por antecipação de receita, previstas noart.165, § 8°, e noart.167, §4° da Constituição da República; - Redação dada pela Emenda Constitucional n° 46, de 09-09-2010, D.A. de 09-09-2010. (g.n.)

Como se observa com facilidade, o constituinte estadual, na mesma linha do constituinte federal, explicitou taxativamente a impossibilidade de vinculação de imposto a qualquer tipo de despesa, fundo ou órgão.

E, impende frisar, a hipótese vertida, qual seja a vinculação transversa ou obliqua da receita de ITU/IPTU, não se enquadra — resta evidente - nas exceções previstas nos dispositivos normativos acima transcritos.

0 imposto 6, portanto, um tributo do tipo não-vinculado, ou sej a, não há qualquer relação entre o Estado, que pode exigi-lo, e o contribuinte, que deve pagá-lo, no sentido de obrigar o primeiro a realizar qualquer atividade especificadamente ligada àquele contribuinte.

A finalidade precipua de sobredita vedação é, revela-se induvidoso, evitar o "engessamento" das verbas públicas, que pode impedir o administrador público de ter liberdade para aplicá-las onde se mostrem necessárias, tendo em vista o interesse da sociedade.

O Código Tributário Nacional — CTN não destoa do entendimento exposto. Segundo oart.16 do CTN,

 "Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente

de qualquer atividade estatal especifica, relativa ao contribuinte". (g.n.)

 

Isto é, imposto é tributo de hipótese de incidência não vinculada.

Outrossim, a Lei em comento ofende, robusta e contundentemente, o principio constitucional da TRIPARTIÇÃO DE PODERES ou o principio da HARMONIA E INDEPENDÊNCIA DOS PRODERES, consagrado pelo art.2°, da CF/88, que preceitua:

"Art.2°. SaoPoderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário." 

A Lei Orgânica do Município, na mesma linha, prescreve:

"Art.14. São Poderes do Município, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo e o Executivo."

Ora, a Lei Complementar n° 1.295/2014, em prevendo o desconto de 50% (cinquenta por cento) ao contribuinte que não tiver seu pedido atendido no prazo de 30 (trinta) dias está, também de forma transversa, criando uma forma ilegal e inconstitucional de pressionar o Poder Executivo municipal a promover a restauração asfáltica das vias de circulação, em notório prejuízo ao exame das prioridades locais inserido no âmbito da discricionariedade administrativa.

Por óbvio, não possui o Município condições de promover a restauração de todo o asfalto de suas vias, tendo, por esta razão, que estabelecer, locomovido por critérios de conveniência e oportunidade e tendo em vista a disponibilidade de recursos, quais vias deverão ser recuperadas com prioridade. E este juizo deve ser exercido pelo Poder Executivo, sempre guiado, dentre outros, pelo principio constitucional da eficiência.

Ademais, como dito acima, por se tratar de um imposto, o ITU/IPTU não é apenas destinado, e nem poderia sê-lo, à restauração de asfalto. Ele pode ser utilizado para tanto, mas não obrigatoriamente. De fato, o ITU/IPTU serve, também, para custear outros serviços públicos, tais como a saúde, educação, limpeza urbana, dentre vários outros. E o uso dos recursos advindos da arrecadação do ITU/IPTU deve se dar — repete-se - segundo padrões de prioridade, pois o que a Administração Pública faz é gerir recursos escassos em face de uma infinidade de necessidades e demandas, sempre crescentes, da população. Por esta razão, deve o administrador realizar escolhas, fixar prioridades, segundo critérios de conveniência e oportunidade.

Não se quer aqui desconhecer a importância de se manter a integridade da pavimentação asfáltica, mas, sim, reconhecer que existem outras prioridades que devem, muitas vezes, se sobrepor a ela, justamente em função da limitação dos recursos públicos disponíveis.

Outrossim, não se justifica a criação de um beneficio fiscal a um especifico contribuinte desatendido no pleito de reparação asfáltica, tal como preceitua a Lei Complementar n° 1.295/2014, em notório prejuízo ao restante da população, dada a previsível queda de receita. 0 beneficio fiscal colimado não atende o interesse público, eis que sacrificará toda a população do Município de Alexânia em beneficio de alguns cidadãos que não obtiveram êxito na demanda, situação que contraria o principio da isonomia. O erário público será privado de importante receita tributária, advinda do recolhimento do ITU/IPTU, em favor de alguns poucos beneficiados.

E como se sabe, a mantença da integridade da pavimentação asfáltica da municipalidade é um serviço público uti universi, ou seja, é um serviço público prestado pela Administração sem ter usuários determinados, pois visa o atendimento da coletividade como um todo, ao contrário dos chamados serviços uti singuli. Nestes, os usuários são determinados e a fruição é particular e mensurável para cada destinatário, sendo remunerado por outra espécie tributária, as chamadas "Taxas"1 .

Ora, quando se promove a tapagem de um buraco, toda a população que utiliza determinada via é beneficiada, e não somente o contribuinte que possui um imóvel em frente ao aludido buraco.

Por derradeiro, cumpre destacar que a Lei em comento expõe uma forma absolutamente inadequada para a consecução dos fins que almeja, criando uma evidente inadequação entre meio e fim, afrontosa aos princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade. Ora, a Lei tem por objetivo precipuo o de evitar que se perpetuem os buracos nas vias asfaltadas do Município. Pois bem; ocorre que a ferramenta utilizada para tal fim — desconto no ITU/IPTU — não é próprio para atingir tal desiderato, pois, pela óbvia razão de que a Administração não conseguirá promover a recuperação asfáltica de algumas ou de várias vias da cidade, sobremodo nos longos períodos chuvosos, a consequente queda de receita redundará em ainda menos possibilidade de fazê-lo. Vê-se uma notória inadequação entre meios e fins..

Por esta e por outras razões é que se entende ilegal e inconstitucional, bem como afrontosa ao interesse público, a Lei Complementar n° 1.295/2014, pois além de vergastar contundentemente os princípios da não-vinculação de receita de impostos, da independência e harmonia entre os poderes, da isonomia, da proporcionalidade e da razoabilidade, dentre outros, contraria a noção básica de serviço público ofertado em caráter uti universi. 

 

 

 

 

 

 

Alexânia, 06 de May de 2014

RONALDO FERNARNANDES DE QUEIROZ

Prefeito Municipal